As cuecas da “Victoria’s Secret”.
Tudo começou num aeroporto onde fiz escala. Daqueles que apelam ao consumismo à bruta. Vislumbrei duas amigas de sorriso aberto com os seus sacos rosa de lingerie escondida e privada. Os seus risinhos pediam insistentemente que lhes fosse perguntado o que adquiriram. Questionei o porquê da compra porque, de facto, me pareceu algo um pouco fora do comum. “Para usar num dia especial”, disse uma delas. Entrei em introspecção imediata e profunda. Daí não mais saí nas horas seguintes.
Não deveriam todos os nossos dias ser especiais? Daqueles que nos arrebatam e nos fazem sentir vivos? Daqueles em que a nossa pele arrepia e o nosso coração estremece? Não deveríamos fazer com que cada nanosegundo se cruzasse com algo que nos extasia?
Chamem-me intensa, exagerada ou desmedida. Quando amamos, queremos, desejamos…não deveremos realmente viver? Dar tudo de nós? Serão alguns dias da nossa vida apenas para trabalhar, descongelar bifes para o jantar e usar aquele pijama roto no meio das pernas e outros para velas, vermelhos de renda e surpresas? Não serão esses dias supostamente especiais que nos corroem as expectativas de felicidade? Que nos criam as desilusões e juízos em relação à entrega das pessoas que temos nas nossas vidas? “No dia dos namorados não me ofereceu nada de jeito”, “Nem se lembrou do nosso aniversário”…
Percorreram-me os neurónios pensamentos sobre as mais cruéis decisões que tomamos todos os dias. Estar a quilómetros de quem mais gostamos, trabalhar em algo que detestamos, acordar para dias sem sentido, viver sonhos que não são nossos ou outras situações sem conteúdo em que nos metemos. Não deveríamos lutar dia-a-dia para o que nos apaixona?
Já não vivemos na era da ambição calculista, das decisões a longo prazo e do deixar para depois.
Relembrei-me dos sorrisos perdidos, das lágrimas derramadas, dos olhares que se desviaram e do cinzento de tantas horas soltas.
Que cada momento se encha de vida. Todos os dias são dias de lingerie sexy.