Aviso à Lisboa larápia, bandida e ingrata.
Escrevo isto porque amo a minha cidade. Lisboa.
Ai a minha Lisboa. Amo como aquele namorado que só tem olhos para uma pessoa. Aquela rapariga que tem uma paixão platónica inexplicável. Amo-a porque todos os dias me surpreende. Acontece que há quem viva nela que decide trazer surpresas menos agradáveis à tona do Tejo.
A humanidade pode ser má. Sabemos disso. Há quem ande por aí a viver do engano e do usufruto. Por todo o lado. No mundo inteiro. O que faz de nós melhores pessoas é combater quem nos faz cair do pódio que atingimos. A nossa maior virtude como portugueses pode bem ser o que não nos faz avançar. Explico.
Portugal foi considerado este ano o 3º país mais seguro do mundo.
Por mais que viaje, nada me dá um conforto pessoal maior que a sensação de segurança. Lisboa está no seu hype máximo com pessoas de todo o mundo a querer entender o que faz desta cidade um lugar incrível para se viver. Têm razão para estar curiosos. É demasiado bom estar por aqui.
Faço um paralelismo com aquela startup que padece de dores de crescimento. Tem um potencial enorme, toda a gente vê isso mas se não se organizar e criar uma estratégia, será provavelmente um flop e daqui a uns tempos já ninguém se lembra.
É verdade que más experiências podem ocorrer em qualquer lado. Há sempre aquela música que adoramos mas nos faz lembrar um ex-namorado ou um momento triste das nossas vidas. Por mais que tentemos não conseguimos deixar de associar uma coisa à outra. Sempre que me lembro de Viena vou sempre recordar uma noite de Inverno que dormi na rua. Verdade também que nos cabe a nós ser positivos e não deixar que uma má experiência nos afecte a percepção do todo. Há coisas que podiam acontecer em qualquer lugar. Verdade também que só quando passamos por uma situação na primeira pessoa é que entendemos o quanto isso mexe connosco.
Todos os meses recebo grupos de cerca de 60 pessoas por cá. Há quem se apaixone como eu por Lisboa mas por mais que me custe aceitar, há quem não entenda a razão deste amor que tenho. Confesso que no início foi estranho. Com o tempo entendo que é como tudo na vida. Nem todos gostamos de arroz. Eu, por exemplo, sou mais do clube da batata. Consigo viver com isso. O que não consigo é viver com o facto de pessoas que habitam e trabalham nesta cidade contribuam para um sentimento negativo em relação a Lisboa e Portugal. Isso incomoda-me. Corrói-me a alma.
Há uns meses tive de ouvir muita vez que vivo num país racista. Magoou-me. Não me identifico. Não identifico os meus amigos nesta afirmação. Não identifico a minha cultura ou o meu país nesta afirmação. Foi-me dito que muito provavelmente por ser branca não vejo isso. Será? Gostava de entender.
Sempre senti que vivo onde a liberdade reside. Onde se aceita cores, bandeiras e orientações.
Ouvi que Lisboa não é segura. O roubo andou à espreita.
O português na sua generalidade é passivo face aos problemas. Tenho legitimidade para dizer isto porque vivia na Grécia quando o FMI chegou por lá e vivia cá quando veio a nossa vez. Com isto não quero dizer que apoio a violência. Muito pelo contrário. Quero dar ênfase à tendência do “não vale a pena porque não vai dar em nada” ou “toda a gente sabe disto e ninguém faz nada” ou “Isso não há nada a fazer. É assim”.
Sabemos que há problemas raciais em algumas discotecas da nossa cidade. Tem sido muito noticiado nos últimos tempo. Infelizmente passei pela situação de ter um grupo de clientes que foi tratado de uma forma violentíssima e que a partir daí nunca mais viu Lisboa do mesmo modo. Acontece praticamente todas as noites se olharmos com atenção ao Tripadvisor. Confesso que não tinha noção desta dimensão. Não vamos fazer nada em relação a isso?
Toda a gente sabe da história do esquema do louro prensado que existe na Baixa e Bairro Alto há anos, certo? Toda a gente sabe que anda um grupinho dessa malta no Cais do Sodré com uma atitude bem mais agressiva a pressionar os turistas a comprar a sua droga falsa. Grupo esse que também anda a roubar malas de turistas nos bares. Há uns meses encontrei um casal de irlandeses a chorar na Praça de São Paulo porque tinham sido assaltados. Lá consegui entender onde estavam hospedados e paguei-lhes um uber para casa. Não vamos fazer nada em relação a isto? Felizmente sei que a polícia já anda de olho. Olhem ainda mais por favor. Olhem.
Carteiristas nos eléctricos? Não chega já?
Mais turistas leva a que más pessoas saiam mais à rua para se aproveitar dessa situação. É essa a fama que queremos ter? Não. Isto não nos representa. Não é assim que recebemos quem nos visita. Porque uma má experiência muda tudo.
Sim. Que podemos nós fazer? O indivíduo comum?
Denunciar. Insistir. Escrever sobre isso. Pressionar para que exista acção. Mais ideias?
Queremos que estes ingratos que não entendem a sorte que têm de viver numa cidade incrível sejam punidos. Que a desonestidade seja vista como algo grave e que nos estraga a reputação. Queremos a nossa Lisboa verdadeira.
Telma Matias
Lisboa não é só Alfama, o Chiado, o Cais do Sodré e toda a zona turística.
Para entenderes realmente de onde derivam os problemas que afectam essa zona da cidade tens que conhecer a outra Lisboa, a Lisboa periférica, esquecida, suja e onde sim há discriminação, desigualdade, pobreza e muita criminalidade. Lisboa vira as costas aos seus subúrbios e não é tão perfeita como parece, há uma Lisboa sem rio e cheia de ghettos.