RIP Noite Lisboeta
Acabemos com a nossa essência. Acabemos com o que nos define. Vamos massificar e ser mais uma cidade qualquer. O nome deste artigo também poderia ser “hotéis como cogumelos”.
Acho mesmo que é o princípio do fim. Lisboa era cool. Era irreverente. A filha atrevida da Europa que se distanciou do resto da família e vive à beira do Oceano. Tinha as suas próprias regras e costumes. A noite encontrava o dia todos os fins-de-semana com animação e diversidade.
Confesso que não amo a nova vibe do Cais do Sodré. Sou daquelas velhas do Restelo que gostava daquilo underground como antigamente. Ia lá a uma quarta ou quinta-feira e sabia que não ia encontrar ninguém porque na grande maioria as pessoas consideravam aquela zona perigosa. Assisti à sua renovação e à maneira como se tornou o sítio para se ser visto mas, compreendi a importância que isso teve para o desenvolvimento do turismo e a intenção de trazer os jovens à beira-rio.
No entanto, dar um novo hotel ao Cais e fechar o Europa, Tokyo e Jamaica é matar por completo a sua dinâmica. Mais queixas do barulho virão, a noite acabará e a própria razão pela qual abre ali um hotel, pela vibrante multidão jovem, a levará a que termine o seu brilho e o glamour burlesco que lhe é tão próprio.
Li hoje que a Câmara Municipal de Lisboa está em negociações para que estes espaços não fechem. É bom. É sinal que entendem que a noite não é um bicho papão que leva as pessoas à desgraça. Estar pelas ruas numa sexta ou sábado à noite é uma maneira de sair um pouco da nossa vida entre quatro paredes no escritório, é um escape.
Queremos ser a capital das startups, da tecnologia, da juventude mas temos de nos dar mais aos jovens que habitam Lisboa. Compreendo que as rendas antigas sejam impraticáveis para que exista melhoria e manutenção adequada. Podia haver um balanço. A Baixa podia não estar vazia. As rendas actuais das casas são um abuso. Não é possível que com os ordenados que se praticam hoje em dia para os jovens, estes deixem de viver em quartos.
O Bairro Alto perdeu a sua garra. Há mais estrangeiros que portugueses. O Cais fecha mais cedo ou fecha de vez. Perdemos aquilo que somos para ganhar outras vestes e formas. Reeinventamo-nos e olhamos o espelho de modo desagradado. Quem é esta Lisboa perdida? Arranjemos novos pólos, novas diversões, novos mundos mas não acabemos com os ícones da nossa vida. É também preciso novidade na noite lisboeta.
Tal como Berlim, acho que a cidade se devia dar mais aos jovens. Olhar para zonas geográficas vazias e perdidas e dar apoios aos senhorios para que as rendas baixem tanto nas habitações como nos estabelecimentos. Assim, novos projectos aparecem, novas vontades se encontram. Novas zonas da cidade se transformam e ganham vida. Tanta gente a querer fazer o que gosta, tantos espaços vazios. Quando é que a Lisboa vai ser nossa e não apenas dos turistas?
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