Transiberiano I – Pequim a Ulan Bator
√Chegada – Pequim
Na China, está tudo em Chinês. Na China não terão acesso a nada do google (inclusive maps e gmail) e facebook. A menos que arranjem um vpn, não vai dar!
Este é um aviso importante para quem ao chegar a Pequim ache que devido à sua modernidade e edifícios megalómanos, a cidade possa estar preparada para turistas. Acredito que seja esta a razão fulcral do seu encanto. Via-me a morar aqui sem problemas. A cidade está feita para os moradores e não para quem visita. Nada está virado para o turista embora milhares de turistas coexistam nestas ruas. O turismo interno ocupa um papel preponderante e é possível ver centenas de bonés de cores diferentes que indicam excursões provenientes de cada canto da China. Escusado será dizer que os chineses são muitos e por isso é perceptível o porquê de não existir uma grande preocupação com turistas estrangeiros.
O metro é super intuitivo e aí sim, as indicações em inglês são preciosas. Nunca esperei mais de 3min por um metro. A rede está mesmo muito bem organizada e entende-se que devido ao facto dos milhões de pessoas existentes na cidade seja uma necessidade.
Se precisarem de deixar a vossa mochila em algum lado para explorar a cidade, na estação principal de comboios custa 25yuan (cerca de 3€) por mala.
Se calhar, erradamente esperava uma china cheia de vendedores ambulantes, food markets imensos e preços especialmente baratos. Nem tudo é o que achamos. Nesta China moderna, existem centenas de centros comerciais onde os vários vendedores se juntam para vender as suas mercadorias. Os preços baratos existem mas é preciso ter tempo para encontrar as oportunidades mais interessantes. Os food markets embora existentes, são severamente consumidos pelos mc donald’s que existem em cada esquina. Literalmente em cada esquina. Chega a ser assustadora a penetração das marcas americanas de fastfood como o mcdonalds’s, kfc, subway ou pizza hut. Dizem que o melhor food market é em wangfujing, o Donghuamen Night Market mas nas duas noites que estive em Pequim, não tive oportunidade de lá passar porque fecha por volta das 22h. No hutong perto de qianmen, é possível comer alguma boa comida de rua.
Os hutongs são os bairros antigos de Pequim. Aqui as casas de banho ainda são comunitárias. Embora em tempos devido à grande modernização da cidade, muitos destes bairros tenham sido deitados abaixo, hoje em dia, muitos deles estão a ser alvo de reabilitação para que não haja uma quebra tão grande de raízes e para que quem visita Pequim possa ainda ver este cenário. Pelo menos foi a ideia com que fiquei.
As ruas são todas muito amplas e largas e tudo vai ser mais longe do que o que parece. O metro é super barato. Entre 3 a 4 yuan por viagem na zona central, o que equivale a cerca de 40 a 50 cêntimos. Na primeira viagem basta ir à bilheteira e pedir um cartão que custa 20yuan (2,7€) que serão devolvidos no fim se entregarem novamente o cartão. Podem carregar o cartão com quanto quiserem mas o mínimo são 10yuan.
No entanto, os táxis também são muito baratos e podem ser uma óptima opção. As bandeiradas começam em
13yuan e só sobem ao fim de algum tempo.
O nosso percurso começou no aeroporto como seria de esperar. Chegámos numa quarta-feira pelas 10h da manhã, com algum atraso no voo e como queríamos ir directas à embaixada da Mongólia para obter o visto que demorava 3 dias úteis (neste artigo falo sobre os vistos do transiberiano), em vez de apanhar o airport express que custava apenas 25yuan, tivemos de optar por ir de taxi que custou 107yuan a dividir pelas duas.
Percebemos que tínhamos sido demasiado optimistas a achar que iríamos chegar a tempo da embaixada ainda aberta. Até porque até hoje não consigo dizer se aquilo fecha às 11h ou 12h dado que na própria embaixada tem as duas informações. Em papel afixado diz uma e numa placa gravada diz outra hora.
No entanto percebemos que tínhamos os papéis em ordem. Bem…quase! Tínhamos de ter o formulário preenchido, foto, bilhete da viagem e invitation letter. Bilhete tínhamos a ida para Pequim e volta de Moscovo, não havia nada que mostrasse que íamos estar na Mongólia. Invitation letter…marcámos um hotel a fingir para ter uma reserva aceite, porque a ideia era fazer couchsurfing.
Na manhã seguinte quando lá voltámos, perguntámos se havia alguma taxa de urgência que pudéssemos pagar para ter o visto em 1 ou 2 dias mas não havia. Pânico! Fizemos olhinhos de bambi e dissemos que já tínhamos tudo reservado e o senhor acedeu a que poderíamos levantar o visto no dia seguinte às 16h, ou seja, na sexta-feira. De outro modo só estaria pronto na segunda-feira e isso implicava mais 3 noites em Pequim sem poder sair de lá por não ter passaportes. Assim, ficava pronto mesmo a tempo de ver Pequim e seguir viagem como tínhamos estipulado. No entanto teríamos de levar já o bilhete para a Mongólia comprado na altura de levantamento do visto, para terem a certeza que iríamos mesmo.
Se nós fossemos pessoas normais, isto não seria um problema. Íamos à estação dos comboios e comprávamos o bilhete de comboio para apresentar na embaixada. Porque o transiberiano faz-se de comboio, não é? Mas a nossa ideia sempre foi fazer a rota do transiberiano e não exclusivamente o comboio transiberiano.
Porquê? Porque há percursos muito caros e outros muito demorados. O percurso de Pequim a Ulan Bator é provavelmente dos percursos mais caros do transiberiano. Custa cerca de 1222 yuans em hardsleepers que é a classe mais barata, que é por volta de 165€ e leva 27horas. Se quiserem mais conforto podem ainda escolher softsleepers (compartimentos de quatro) e há alguns comboios que partem de Pequim que têm uns compartimentos de apenas duas pessoas que é mais caro mais dá obviamente mais privacidade.
Lemos em alguns blogs que é mais barato ir de autocarro. Apenas 180yuans (cerca de 24€) até à fronteira da China com a Mongólia, em Erlian. Depois começa a aventura. Já explico melhor 🙂
O nosso drama neste momento residia no facto de que sabíamos que os autocarros não tinham pré-reserva e por isso não seria fácil arranjar um bilhete para mostrar na embaixada. Arriscámos e fomos à estação de autocarros que se chama Mùxīyuán Bus Station e fica a cerca de 1,5-2 km do metro de Dahongmen ou Liujiayao. Como estávamos com pressa apanhámos uma espécie de riquexó motorizado, não tivemos muito tempo para negociações mas tentem negociar por 10-15yuan.
É de esperar que nas informações se fale inglês mas isso não vai acontecer. Fomos enxotadas do sítio onde se compram bilhetes para lá mas também não percebiam nada do que perguntávamos. Os autocarros dali partem às 15.10 e 15.50, algo que para nós não servia porque só podíamos levantar o visto às 16h na embaixada.
Era importante ir neste dia ainda porque o nosso tempo para fazer o transiberiano era escasso. Usámos o guia do lonely planet para perguntar quando era o último daquele dia, o primeiro do próximo, pedir para comprar e levar já o bilhete…zero de entendimento. Apareceu uma menina nova que estava de passagem para apanhar um autocarro que nos ajudou a explicar a situação e de repente já havia um bus que partia às 18h de uma outra companhia e que nos podia dar o bilhete. Nisto, estávamos a seguir um senhor aleatório e a entrar por um pequeno guetto perto da estação. Basicamente é sair da estação, virar na 1a à direita, depois 1a à esquerda, passam um pequeno food market e à direita vão encontrar um descampado com um autocarro que parte mais tarde para Erlian. É onde está um letreiro grande branco com letras vermelhas. Aconselho a andarem sempre com o guia porque tem os nomes das cidades em Chinês e facilita muito a explicar o que queremos.
Lá nos deu o bilhete, nem pagámos logo nem nada e fomos directas à embaixada levantar o passaporte. Estava lá uma confusão tão grande que nem nos pediram bilhetes, no entanto não foi tempo perdido porque se não tivéssemos ido à estação, teríamos de ficar mais uma noite em Pequim. O que nem era mau porque gostei muito da cidade mas a ideia era continuar o transiberiano.
Antes de vos contar como se passa a fronteira da China para a Mongólia, tenho de vos contar um episódio caricato. Quando chegámos numa quarta-feira, ficámos a fazer couchsurfing na casa de uma menina chinesa super querida, no entanto só pudemos lá ficar uma noite porque ela já tinha mais couchsurfers para receber no dia seguinte. Na manhã de quinta-feira deixámos os passaportes na embaixada da Mongólia. Na quinta à noite era preciso arranjar um sítio para dormir. Tentámos couchsurfing mas estava difícil de contactar até porque para ter net tínhamos de ir ao mc donald’s. Marcámos o hostel mais barato que encontrámos, o King’s Joy Hostel e não nos deixaram fazer check in porque não tínhamos passaportes. Ainda bem que tirámos umas cópias do passaporte e vistos da China e Rússia. Com as cópias e o papel da embaixada, pediram-nos para ir à esquadra para a polícia confirmar que nos podiam albergar. 21h em Pequim, já não se passa nada na rua apesar de ser sexta à noite, lá fomos nós pelo meio do hutong para ir à polícia. Chegámos à polícia, parecia que não sabiam muito bem o que nos deviam fazer mas lá fizeram uns telefonemas e ligaram ao hotel a dizer para nos receber. Ser sem-abrigo em Pequim não fazia parte dos planos.
Vamos ao que interessa. Como ir até Ulan Bator de um modo mais barato. Como vos disse, a primeira fase é apanhar um autocarro até Erlian. O nosso autocarro estava marcado para sair às 18h mas só saímos de lá pelas 20h. Até essa hora escusado será dizer que éramos a diversão do momento dado que éramos as únicas estrangeiras. Ofereceram-nos um gelado durante a nossa espera. Tenho que confessar que nunca vi um tetris tão perfeito. Todas as pessoas tinham imensas caixas para levar. Havia um rapaz que levava um esquilo, uma tartaruga, uma arca cheia de sacos de água com peixes e todo o material para construir um aquário dos grandes. Depois de muitos pontapés, lá conseguiram pôr toda a mercadoria no autocarro. Nada de espaço para as nossas malas. O autocarro era só de camas. Três filas de camas com uma cama em cima e outra em baixo. As malas que não cabiam em baixo ficaram nos corredores entre as camas. Escusado será dizer que os nossos lugares eram na parte de trás do autocarro e que passar por todas as malas no chão com as nossas mochilas às costas foi um episódio digno de jogos sem fronteiras. A cama era super confortável e aterrei assim que me deitei. Demorámos cerca de 11 horas para chegar à cidade fronteiriça e eram 7 da manhã quando saímos do autocarro.
Existem algumas maneiras de passar a fronteira depois de chegar a Erlian. Podem ir de autocarro que segundo o que lemos é a opção mais barata. Apenas 50yuan por pessoa (cerca de 6/7€). Existem também comboios mas não explorámos essa vertente. Ouvimos falar de uns jipes que enchiam e passavam a fronteira. Como tínhamos pressa e queríamos chegar a tempo de apanhar o comboio para Ulan Bator ainda nesse mesmo dia, era a forma mais rápida. Basicamente quando chegamos à estação de comboios, é possível ir a pé até ao mercado onde se apanham os jipes. Não é muito longe. No nosso caso, como estava a chover apanhámos um taxi até lá que custou 20yuan (2,7€) a dividir pelas duas. Os jipes cobram cerca de 80yuan (10/11€) por pessoa para a fronteira e ir até à estação de comboios de Zamin Ude. Dividimos um jeep com dois rapazes da Mongólia que pagaram o mesmo que nós e por isso percebemos que não era preço de turista.
Lemos em blogs que demora algum tempo no controlo das fronteiras mas tivemos muita sorte porque fomos logo à hora de abertura, às 8.30. É preciso fazer bem contas às horas porque a fronteira fecha às 17.30. Foi muito rápido! A pessoa que demorou mais tempo até fui eu na saída da China. Achamos que foi porque no meu passaporte o meu nome está bem escrito (com acento) e no visto não tinha acento. A rapariga do controlo não falava inglês para me explicar o que se passava, chamou outro rapaz que me perguntou como me chamava umas 4 vezes. Lá me deixaram ir. Ficar presa na China por causa de um acento no nome era capaz de ser parvo. Por isso pelo sim pelo não, não escolham nomes com acentos para os vossos filhos.
Assim que passámos a fronteira da Mongólia, trocámos do jipe para um carro mas este transporte já estava incluído no preço.
Chegámos à estação de Zamin Ude por volta das 9.30/10h e o único comboio para Ulan Bator era às 18.15 e custou 22850t (cerca de 10€) em hardsleepers cada uma e demorou 15horas. Os hardsleepers sinceramente são suficientes. Com o cansaço da viagem, dorme-se muito bem. Claro que se quiserem um colchãozinho mais fofo, não é muito mais caro, fica entre 15-17€. Oferecem chá a bordo do comboio. Têm também direito a lençóis, mantas, fronha e uma toalhinha. Os lençóis, fronha e toalha vêm empacotados. Como tenho imensas alergias, dispensei a manta e dormi dentro do saco-cama. Não há wifi nem tomadas. Pelo menos nesta classe.
Foi pena estar a chover porque não houve oportunidade de explorar Zamin Ude para além da praça em frente à estação de comboios. A estação não é o edifício velho que vão ver à vossa frente. É o edifício espelhado da esquerda. Aí têm cacifos para deixar a mala, ATM, banco para trocar dinheiro, podem comprar um SIM card, comprar comida no supermercado e há até umas camas para dormir que podem alugar. Tomadas é que não encontrei e procurei nos pisos todos.
Preço final da capital da China à capital da Mongólia: cerca de 47€ em vez de 165€.
Valeu a pena porque ganhámos tempo uma vez que caso não fossemos de autocarro, o comboio era só na manhã de sábado pelas 11.30, o que fazia com que só chegássemos a Ulan Bator às 14.30 de domingo e aproveitássemos menos o dia por lá. Poupámos ainda quase 120€ mais a noite extra que teríamos de ficar em Pequim para apanhar o comboio no sábado. As duas noites que passámos em transportes foram a dormir e por isso pagámos dois em um: Transporte e dormida 🙂 Já para não falar da riqueza da aventura em si.
O resto da viagem virá brevemente em novos artigos.
Pedro
Ulan Bator a capitalzona do país de topografia invocada, ora extremamente nivelada ora imponentemente elevada em maciços e contrafortes dispostos suaves em vales e vastidões que enlevam corações. É que a magnitude de Deus assenhoreando nossa pequenez nos confunde no desenho imenso da superfície variadíssima do planeta onde fomos colocados provisórios. Se assim, colados e presos ao solo de um imenso globo ficamos extasiados, quanto mais não ficaremos quando desprendidos navegaremos na eternidade de terceiros Céus para cujas visões os humildes outrora incorporados serão contemplados…:)
Ana A.
Sempre que viajo agradeço secretamente aos meus pais por me terem chamado Ana.
Só nestas ocasiões percebemos a importância e impacto que o nosso nome pode ter em coisas mínimas.
Estou curiosa pelo resto da aventura!